quinta-feira, 25 de novembro de 2021

CRISE DE VALORES

 

Há algumas semanas podemos ver na mídia e nas redes sociais imagens assustadoras das pilhas de roupas que transformam a paisagem do deserto do Atacama, e assim ressurgir a preocupação com o consumismo e as consequências para o planeta.

São levantadas questões ambientais, sociais e econômicas, muitas acusações, reprovações e poucas soluções.

Eis que essa semana sou convidada a assistir um documentário: “A conspiração da Lâmpada” disponibilizada pelo canal do youtube “Consciência Universal”.

Deve estar se perguntando o que raios é conspiração da lâmpada e qual a relação com o deserto do Atacama.

Primeiro: Já ouviu falar em obsolescência planejada ou programada?

A obsolescência planejada ou programada acontece quando um produto tem uma predisposição para substituição em um curto período de tempo, ou seja, irá se tornar obsoleto dentro de um período programado pela falha do produto ou mudança de designer.

Pois bem, segundo este documentário a lâmpada foi o primeiro produto em que a obsolescência programada foi aplicada. Fabricantes de lâmpadas formaram um cartel em 1924 e concluíram pela necessidade de redução da vida útil das lâmpadas para 1.000 horas e a interrupção de pesquisas que visassem aumentar essa vida útil.

A indústria de automóvel também é revolucionada por essa ideia, a GM passa a trazer opções de modelos e cores, dando forma a ideia de que os veículos deveriam ser trocados a cada três anos.

As empresas assim como nós são orientadas por valores, neste caso o valor econômico a busca por eficiência nas vendas e geração de lucro, sobrevivência financeira em longo prazo.

Nasce a ideia de crescimento infinito do mercado e do lucro. Mas quais as consequências disso?

Inovação, indiscutível que essa é uma das consequências. Quando pensamos em cientistas, químicos e engenheiros nós pensamos: em avanços tecnológicos, pesquisas, inovação, descobertas, melhorias. Correto?

Nesse ponto nos deparamos com um conflito e quando essas pesquisas, descobertas, inovações, melhorias e avanços colocam em risco o mercado, todo um setor de produção e vendas?

Vamos a um exemplo: o documentário traz o exemplo do setor têxtil que com a descoberta do nylon extremamente resistente viu ameaçado a produção e venda de alguns produtos e iniciou pesquisas para tornar esse material menos resistente e retornar ao status quo.

Quais os valores desses cientistas, químicos e engenheiros? Manter seus trabalhos e realizar pesquisas tão desafiadoras quanto, mas contrárias ao impulso natural de melhoria ou desafiar um sistema?

Segurança e sobrevivência são valores básicos que guiam a maioria de nossas decisões.

Na década de 50, Brooks Stevens tornou a ideia da troca constate, visto que um produto é regularmente atualizado e melhorado algo natural e na verdade desejado pelos consumidores. Afinal quem não quer uma televisão 10 polegadas maior, ou um celular mais rápido?

Atenção: outro conflito a vista! Desejamos um crescimento infinito do mercado, uma melhora constante dos produtos e consequentemente o descarte constante de produtos, mas vivemos em um planeta com recursos e espaço finito. Esse sistema possui sustentabilidade?

Percebe agora a correlação dos temas? Exatamente o Chile recebe toneladas de roupas que são descartadas no deserto do Atacama, Gana recebe toneladas de eletrônicos sucateados, e com certeza poderemos encontrar outros exemplos.

O meio ambiente sofre, com o consumo desregulado. Matérias primas são extraídas e nossos suprimentos finitos diminuem, toneladas de produtos se tornam lixo e encontram destinos em locais isolados como o Atacama ou ignorados como Gana, gerando mudanças radicais na paisagem, nos recursos ambientais e na sociedade do local.

Quais valores são prioridade enquanto sociedade? Qual o destino dessa priorização?

Países Europeus e os Estados Unidos descantam seu lixo eletrônico em Gana de forma irregular, pois enviam esse material como produtos de segunda mão, contudo menos de 20 % realmente tem condições de reaproveitamento. Qual a consciência ambiental e social desses países? As ações estão alinhadas aos discursos ambientais? Realizar mudanças urbanísticas em seus países, mas ignorar o impacto que seu descarte causa a outros países está em harmonia?

Algumas pessoas têm feito essas perguntas, refletido e pensado soluções. Algo que parece senso comum é que o planeta tem dado sinais de que essas perguntas devem ser pauta mundial, e em alguma medida tem sido.

Contudo parece que as conclusões são novas perguntas: Reduzir o impacto ambiental é possível sem uma mudança de valores? Sem uma mudança no sistema econômico financeiro?

Resolver um conflito de valores parece uma tarefa impossível, mas aproximasse o dia que sobrevivência e segurança podem não ser mais opções.